Rodrigo
Corrêa Teixeira
HISTÓRIA
DOS CIGANOS NO BRASIL
Núcleo de
Estudos Ciganos
Recife – 2008
Págs 24 e
25
Ressalta-se que os contatos entre
a família real e alguns ciganos cariocas não significavam boas relações entre
os demais ciganos e a sociedade como um todo. Mesmo durante a estada da corte
portuguesa no Rio, período em que o status dos ciganos esteve mais elevado, os
ciganos não deixaram de estar associados à criminalidade. Há inúmeros
testemunhos de viajantes que falam do temor popular, no interior do país, quanto
a supostos furtos cometidos por ciganos. Em 1823, dois anos depois da volta da
família real, Maria Graham escreve em seu diário de viagem: "Alguns deles
dedicam-se ao comércio e muitos são extremamente ricos, mas são ainda considerados
ladrões e trapaceiros, e chamar um homem zíngaro (cigano) equivale a chamá-lo
de velhaco."71
Assim, em fins da década de 1820,
os ciganos já não eram mais requisitados para se apresentarem nas festividades
na Corte do império recém-fundado. Não havia qualquer possibilidade de eles
servirem ao perfil que se queria para o "ser brasileiro".Já nos
inícios do século XIX, a questão da raça era um tema fundamental na definição
da identidade nacional, mesmo que através de uma afirmação romântica do exotismo.
72
No momento imediatamente
posterior a Independência, buscou-se descrever a nação de forma “a histórica”,
via paisagem natural.
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Afluíam naturalistas ao Brasil, a
princípio, procurando pesquisar a flora e a fauna, mas que passaram a se
interessar pela população, principalmente das cidades, distinguindo os tipos
humanos e analisando os efeitos da miscigenação. A gradual incorporação do
discurso científico ao conceito de "ser nacional" teve seu marco bem assentado
no ano de 1838, quando foi criado o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Isso ia ao encontro da prática historiográfica que vinha se desenvolvendo na
Europa. Em meados do século XIX, o Império elegeu o indígena como seu símbolo
fundamental e fez-se o discurso de que a miscigenação entre o branco, o negro e
o índio promoveria o patriotismo e consolidaria a nação.
Diante disso, a presença dos
ciganos na composição da população seria omitida, pois era uma minoria difícil
de ser apreendida por esse discurso nacionalista. Negando-se aos ciganos o direito
à história, tentava-se colocá-los à margem da "boa sociedade." Como
se verá mais adiante, paulatinamente, uma série de medidas repressivas fecharam
o cerco sobre os ciganos.
71
. Graham,
M., Diário de viagem ao Brasil e de uma estada nesse país durante parte dos
anos de 1821, 1822 e 1823, São Paulo, Cia. Editora Nacional, 1956, p. 286.
72
. Schwarcz,
L. Moritz, “Questão racial no Brasil”, IN: Schwarcz, L. Moritz & Reis, L.
V. de Souza (Orgs.), Negras imagens: ensaios sobre cultura e escravidão no
Brasil
, São
Paulo, EDUSP, 1996, p. 153.
73
.
Sussekind, F., O Brasil não é longe daqui: o narrador, a viagem, São Paulo,
Cia. das Letras, 1990.